Nau dos loucos (ou história da loucura)
- André Cabral
- 8 de mai.
- 2 min de leitura
Atualizado: 15 de mai.

NAU DOS LOUCOS - Com frequência, deparamo-nos com comentários relativos à “Grande Internação”. Pobres, portadores de doenças venéreas, insanos, indigentes, “mulheres caducas”, “velhas infantis”, “espíritos fracos”, muitos destes unidos pelas “cartas régias” (lettre de cachet) - ofício utilizado no século XVII com intuito de banir o convívio social. Documento emitido pelo rei, visava atender a demanda de familiares, que buscavam interditar seus incômodos consanguíneos. Por estes relatos, precipitamos a história da psiquiatria e da psicopatologia, seguidas das intervenções de Pinel e Esquirol. O que pouco se dissemina é que a grande internação é, em parte, fruto do racionalismo cartesiano que, pelo cogito - “Penso, logo existo”-, condenou o louco e o desatino à “inexistência”. Se Descartes contornou a eventualidade do sonho ou do erro, o mesmo não foi feito diante do perigo da loucura. O sonho pode ser um pensamento falso sobre a coisa, mas não se duvida do pensamento. Diferentemente, na loucura o que se compromete não é o objeto (falso ou verdadeiro), mas o próprio pensar. As figuras do desatino, da insanidade, que perturbam a sexualidade, a exemplo de Sade, passam a ser exilados entre as paredes que antes abarcavam os leprosos na idade media. Contrariando o cartesianismo, Foucault retorna ao Renascimento, demonstrando ser a loucura lugar da verdade. Recupera duas formas de experiência: trágica e crítica. Pela experiência trágica, cita Bosch e o quadro Nau dos loucos. Na pintura, encontramos o navio, responsável por levar os loucos da cidade aos confins da terra (representante do estrangeiro); ao topo, pintado ao lado direito, uma árvore fincada, mastro que faz alusão ao fruto proibido, saber infernal extraído do Jardim das Delicias e do éden; no centro, uma bola de cristal, objeto supostamente vazio, mas que possui um saber àquele que consegue melhor espreita-lo. No trágico, rememoramos o encontro entre a figura do louco e a verdade obliterada nos tempos do inferno da razão. Recuperamos a experiência do insensato no centro do pensamento ocidental. Interpelamos: quais são as cartas e a cosmovisão nos tempos de hoje? (Por André Cabral 02/05/25) (Postagem adaptada para Instagram)
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